segunda-feira, 23 de julho de 2018

Conto O Calor



Em um novo devaneio estético de um dos prédios que se posiciona exatamente ao lado da sua agência, toda a frente está ornamentada com lâminas de vidro espelhados que refletem, com todo o seu explendor, os fótons e a energia térmica cósmica oriunda de uma estrela de quinta grandeza que ilumina o nosso planeta não tão distante assim da gente: a luz emitida da fusão nuclear ali presente leva parcos 8 segundos para colidir com o nossa tênue ectosfera. Pois bem, este calor concentrado dirigido para a agência do Ribamar tem causado inúmeras achados curiosos: peças de plástico que formavam as letras garrafais exuberantes da agência estavam em um processo de derretimento franco após a instação das lâminas espelhadas no outro prédio, muito calor mesmo. Os aparelhos de ar condicionado estavam passando por um processo de revisões mais constantes já que o calor interno da agência aumentou e para conseguir manter 30 graus! ,  ajustados no termostato, estavam tendo que colocar os bofes para fora com o ventilador ao máximo. Interessante o processo de adequação que o homem se habitua:  antes do aumento súbito do calor pela espelhada decoração do outro prédio, era comum a necessidade de desligar alguns aparelhos de ar condicionado ou aumentar um pouco a temperatura, pois o frio era intenso. Alguns clientes costumazes já vinham para o estabelecimento com casacos comprados em alguma viagem para um lugar um pouco mais frio como o Alaska. Já ocorrera de um cliente neófito que estava aguardando uma longa jornada de cadastro para avaliação de empréstimo ter sofrido de hipotermia – alguns confessam que o incidente acelerou a aprovação do empréstimo solicitado pelo cliente que pedia uma fábula para abertura de uma merceria especializada em carne de gia em Aquiraz, cidade conhecida por possuir a primeira casa do estado do Ceará e que é conhecido o desgosto da população pela carne do dito réptil.
Ribamar já não aguentava mais a sudorese que afetava, principalmente, as suas axilas. Ficava marcado por mais que tivesse tentado usar vários tipos de desodorantes para evitar o suor. No ambiente de trabalho, tinha que manter a discrição e se mostrar higiênico: uma agonia. Pensava que o próprio nervosismo levava a piorar a cachoeira axilar. Cada vez mais, passava a usar camisas de cores escuras, pois evidenciava menos o rio que surgia sob seus ombros. Começou a investigar sobre o assunto e descobriu que tem pessoas que tem sudorese excessiva em outras regiões do corpo: mãos suadas que podem borrar cartas ou documentos – motivo de demissão do trabalho, - absurdo, pensou. Outros podem escorregar devido os pés que, também, suam patologicamente. Começou a achar que o melhor é se contentar com o seu suor e agradecer a Deus porque não fedia – esqueceu de perguntar para quem trabalhava perto dele sobre o odor que beirava o enxofre. Acontece que com as altas temperaturas dentro da agência, suas roupas estavam encharcadas e não conseguia mais esconder este incomodo.
Quem vive em cidades quentes, ensolaradas, principalmente no sertão, onde a maior parte do tempo o céu é azul, sem nuvens, acha lindo um céu cinzento. Sensação de alegria coletiva quando se olha para cima e tudo está nublado – possibilidade de chuva real e temperatura mais amena. O sol que queima as frontes desnudas deste povo. mais concentrada em áreas próximas do equador, dá uma trégua tênue e refrescante. De repente, um povo que se acostuma a se proteger cada vez mais do sol cáustico usando roupas que cobrem todo o corpo, bonés, protetores solares, diminuem os cuidados quando o sol desaparece por detrás das nuvens e, mais uma vez, notam que o sol queima suas peles por mais que encontre vapores de águas no seu caminho. Ribamar, na verdade, nem gosta de usar protetor solar porque acha melequento e caro. Ele tinha vontade de morar em um locar que fosse nublado e frio o tempo todo. Acreditava assim que poderia diminuir o seu suor, não era uma idéia por demais tola. Enfim, entre sonhos e soluções, tinha que encontrar uma cura para o mal que o afligia.
Tinha que procurar um especialista que o ajudasse, algum médico, mas qual seria$ Às 2 horas da madrugada, chegou na emergência de uma hospital que havia no seu bairro. Após uma demora de 1 hora, adentrou o consultório médico:
- boa noite, adianta Ribamar para criar um vínculo com o médico que se encontra já abatido de uma noite de muito trabalho na emegência.
- boa noite, responde o médico imaginando o que um senhor com um aparente vigor físico estaria em uma emergência médica naquela hora
- Doutor, eu tenho um problema grave e gostaria de pedir uma ajuda ao senhor, desabafa Ribamar. Tenho uma suadeira no meu suvaco mesmo, cansei de falar axila, o nome é suvaco mesmo, o senhor me perdoe – confessa Ribamar. Nosso protagonista relata todo o seu infortúnio da sua sudorese e aguarda a solução do médico.
- Senhor Ribamar, excesso de suor não é motivo de vir para emergência, pondera o médico. Subitamente, o doutor reflete um pouco e decide pelo menos orientar o paciente para que o mesmo não fique sem solução para o seu caso. O médico namorava outra médica que é dermatologista e já ouvira falar que somente haviam 3 tipos de tratamentos: cremes que diminuiam o suor, cirurgias que seccionavam o nervo que produz o estímulo do suor e a injeção de toxina botulínica na área afetada. Orientou, portanto, o suado paciente a procurar uma consulta com o dermatologista.
- Se o senhor não tiver plano de saúde ou pagar uma consulta com um médico particular, o senhor deve solicitar um encaminhamento em um posto de saúde – finalizava a consulta o médico com a sensação de dever cumprido.
Finalmente, após muitos percalços, Ribamar consegue ser consultado por um dermatologista que atende na rede pública em um centro de referência em dermatologia. Fica um pouco triste quando descobre que a loção para diminuir o suor que o médico dermatologista tinha receitado não tinha surtido o efeito que ele desejara. Volta para a consulta do especialista e se depara com um dilema: se submeter a fazer uma cirurgia por um cirurgião para seccionar um nervo que inerva a área da axila e abole a secreção de suor em toda a área inervada pelo dito nervo e arcar com a possibilidade de ficar com uma área anestesiada se afetar algum feixe nervoso ou aplicar uma substância, chamada de toxina botulínica, em vários pontos sob pele, que diminui, temporariamente, a produção de suor – método menos agressivo e caro, já que o serviço público não considera a sudorese excessiva como doença e não disponibiliza este fármaco.
Começou com a peregrinação de tentar encontrar alguma outra forma de resolver o seu problema sem ter que passar por estas orientações médicas já que o valor dos tratamentos era proibitivo para o seu parco orçamento. Fez uso de vários chás, garrafadas, esfregou a casca de romã na pele suada, até banha de bode capado foi usado como tratamento alternativo, todas tentativas vãs. Até que um dia, recebe uma ligação do centro de dermatologia referindo que havia iniciado uma pesquisa para o tratamento para sudorese com laser e o dermatologista que houvera atendido ele lembrou do seu caso. Um súbito contentamento tomou posse do seu ser e, entre choro e palavras desconexas pelo nervosismo, aceitou comparecer na outra manhã para iniciar o processo de tratamento proposto. Um sucesso. Logo nas primeiras aplicações, o resultado já era evidente – não se formava suor na área axilar, totalmente abolido. Ribamar nas consultas posteriores com seu médico dermatologista não parava de explicar como a sua vida estava transformada, estava usando roupas melhores, caprichando no visual, voltou até a estudar para concluir o segundo grau pensando em iniciar uma faculdade. Isso era um alento para aquele dermatologista cansado. Uma vida impactada pelo sucesso de um tratamento. No meio de seus livros e teses acadêmicas, há um vasto espaço para os milagres nas doenças, em boa parte dos casos, de difícil ou impossível tratamento. Não totalmente satisfeito, procura os arquivos da pesquisa para compreender todo o método empregado. Descobriu que foram utilizados dois grupos de pessoas, no primeito era injetado uma nova fórmula de um derivado sintético da toxina botulínica nas axilas de paciente com excesso de suor e em um outro grupo era injetado apenas água destilada, isto é, sem efeito biológico nenhum. Pra sua surpresa o Ribamar estava arrolado no grupo dos que receberam a injeção de água destilada. Como seria possível$ Pensou em ligar para o Ribamar e contar este achado e dividir consigo esta surpresa, mas ponderou e entendeu que este efeito placebo não deveria ser mencionado. A fé no tratamento foi tão grande que seu corpo acreditou na cura e se automodelou, um milagre. É quando o excesso de otimismo da esperança cura o pessimismo da evidência!

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